O nome do vento

 


O calor do dia, que fez milhares de corpos acostumados com corações frios suarem em seus pontos mais íntimos, tornou-se penumbra, com ventos que cortavam peles e poros.

As portas rugiam perante tamanha força, e as venezianas não davam conta de conter nem o éolo que entrava, nem o desfastio de prazer que se seguira.

Nunca o quisera.
Mais do que isso: jamais pensara possível existir tamanho desejo, quiçá por um homem sensível como aquele.

Como era doce.
Seus fios de cabelo negros, contrastavam com a pele alva e macia, e os olhos marcavam a quem tivesse a chance de ver.
O caminhar era uma dança, que fazia mover cada parte daquele corpo, como música para os olhos de quem inalava o acre nectarino.
A boca, desenho de Édouard Manet, sempre cheia de brilhos.
A voz rouca e delicada - ah, aquela voz! - deixava a marca na psiquê de quem tinha o raro prazer de apreciar qualquer pronúncia, prosa, gemer ou verso.

E tudo era tão verso, que quando fez tocar esta mesma boca no lábio de quem trocava só olhar…
Caiu a noite, e a lua fez tocar o mar.

Os nus, feito a Vênus de Botticelli, eram pura sinergia, tornando-se, então, letargia, pelo prazer sem medidas.
E o vento cantou, pairando sobre aquela montanha de corpos delirantes, isolados de uma cidade ora silenciosa, que agora ofegava prazer, com as delícias dos gemidos, ecoando em ruas e bueiros, prédios e canteiros.

O nome daquele vento, não se sabe.

O que se sabe é que, embora forte a ponto de
ricochetear entre a selva de pedras, não fora suficiente para abafar o calor e o som daquele lugar de amores.

[Jade Rosa] 15/09/2020
Imagem: "Noite Estrelada", de Vincent Van Gogh, 1889.

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